666 - o número da besta... quadrada!
Para começo de conversa, aqui está algo que você precisa saber:
“Tudo o que é imposto a você não deve ser respeitado.”
Não entendeu? Eu explico.
Quando alguém te expõe um ponto de vista, é seu direito sagrado concordar, discordar ou avaliar aquilo que foi dito e tirar suas próprias conclusões.
O maior presente que o “Fófis lá de cima” nos deu foi a chance de escolhermos e seguirmos o melhor caminho à nossa maneira durante a nossa existência. Isso tem um nome: Livre Arbítrio.
Certo ou errado, há situações pelas quais você tem que passar para atingir um único objetivo: evoluir. Se você toma uma decisão na vida e acerta, parabéns: vá em frente e repasse sua experiência positiva à outras pessoas.
E se você fez uma cagada monumental, sofreu pra dedéu, mas aprendeu com os erros, parabéns também: isso é sinal de maturidade.
Mas, claro, ainda tem gente nesse mundão que se julga o “Dono da Verdade” ou, o que é bem pior, “O Escolhido” por um Ser Supremocósmicocelestial e por esse mero motivo insignificante, acha que tudo o que lhe dá na telha é a mais pura afirmação da realidade. São conhecidos também como Golpistas Espirituais.
Dando um exemplo clássico, posso citar o famoso “neoevangélico”. Aquele ser abestado e afetado que, de bíblia amarfanhada numa das mãos, rodopiando-a sem parar na direção de um céu imaginário, atazana nossas cabeças “pregando” em alto e mal som, palavras vazias, repetindo versículos bíblicos decorados à exaustão, tentando nos impor uma verdade hipócrita, sem que um pingo de bom senso tenha a chance de permear a razão deste “macaco adestrado”.
Você acha minhas palavras agressivas? Que estou generalizando esse tipo de “religioso”? Que sou preconceituoso? Então, acompanhe esse relato básico:
Era uma vez a Ursa Maior estatelada no chão da sala, quase nua em pelos, olhos pregados na telinha. Era um domingo. Nove da manhã. Fórmula 1. Minha única diversão na TV aberta.
Vai ser dada a largada. Dedos cruzados. Massa toma a ponta. Alonso logo atrás. Toca a porra da campainha. Vou atender. É um rapaz franzino com cara de rato. Nunca o vi mais gordo.
Empacotado, todo de cinza, suava em bicas debaixo de um paletó que certamente fora de seu bisavô. Pergunto do que se trata. Ele quer ter uma palavrinha comigo. Pergunto sobre qual assunto. Antes do sujeito responder, eu já sabia a resposta. Digo que estou ocupado, assistindo minha corridinha de F1. Ele diz que é um “enviado” de Deus. Dou um belo sorriso amarelo.
“Êta deuzinho sacana esse seu, não é mesmo?”, digo a ele. Tomo um esporro. Eu não tenho o direito de proferir o nome do Senhor em vão, segundo as sábias palavras decoradas do (en)viado.
Peço, educadamente, que o fulaninho vá embora. Ele insiste em querer me dar uma palavrinha. Ganho um panfletinho sagrado. As imagens multicoloridas de famílias felizes repousando em pastos verdejantes me fazem verter uma micro lágrima. Snif, snif. Respiro fundo. Calculo rapidamente que em cinco minutos eu vá conseguir despachar o Mala.
Convido-o para entrar. Sentamos na varanda. As ondas, distantes, acariciam serenamente a areia fina. O sujeito retira um lenço roxo-hematoma não sei de onde. Enxuga as faces sardentas.
Ofereço uma água, apesar do momento ser mais apropriado para uma supimpa cerveja gelada. Dois copos. Água fria goela abaixo, olho o relógio no pulso do rapaz. Rezo para ter um safety-car durante a corrida. Ele começa a pregar a Palavra. O mesmo sermão de sempre. Vamos todos viver no Paraíso, se aceitarmos Jesus como nosso único Salvador.
Blá, blá, blá. Três minutos se passaram. Interrompo o discurso vazio. Pergunto ao sujeito se ele acredita piamente naquilo que tenta impor a mim. A resposta é positiva.
“Você já leu a bíblia de cabo a rabo?”, lanço-lhe um desafio. Ele diz que não. Eu afirmo que sim. Ele me pede para citar um versículo de João. Modesto como eu sou, vou além, e lasco-lhe “nas oreia” um pouco de Mateus, Marcos e Apocalipse... ah, e também uns trechos dos Salmos, claro.
Tudo com tradução simultânea. Não repito palavras vazias. Dou um sentido para elas. Uso a lógica embasada em séculos de pesquisa e experiências na carne. Exponho fatos concretos. Odeio teorias. Ele fica de queixo caído.
Ele pergunta qual a minha religião. Confesso que atualmente não sigo mais nenhuma doutrina específica, apesar de ter buscado o conhecimento em muitas. Afirmo que já encontrei as respostas para todas as minhas dúvidas nesse sentido. Dentro de mim-eu-mesmo. E em poucas palavras, digo ao enviado de onde eu vim, o que faço aqui e para onde eu vou... no futuro.
“Eu sou minha própria religião!”, afirmo, categórico.
Desnorteado, ele rodopia as páginas do seu livro gosmento. Quer me impressionar com mais palavras vazias. Jogo a toalha. Acabou minha paciência. Pergunto novamente se ele compreende o ensinamento nas entrelinhas. Ele não sabe o que é “entrelinhas”.
Mudando o foco do assunto principal, o sujeito despeja uma enxurrada de perguntas sobre minha vida pessoal. Respondo tudo com muita calma. E quando ele “descobre” que eu sou gay, e ainda por cima, assumido, uma falsa indignação toma conta de seu rosto raquítico, afogueado.
Escuto treze minutos de barbaridades a respeito do meu desrespeito aos mandamentos do Senhor. Subo nas tamancas, jogo os tufos salientes dos meus cílios espessos para trás (que falta me faz um cabelão nessas horas) e resolvo acertar as contas com o “nhorante” na mesma hora.
“Abra a porra da sua bíblia!”, eu digo ao sujeito, educadamente. Encontre ai uma única palavra de “condenação” do seu deus para com os homossexuais.
Gaguejando, ele me oferece o trivial: lá vem “Sodoma e Gomorra”, lá vem “é impuro o homem que se deita com outro homem...”, lá vem uma saraivada de palavras moralistas de um livro repleto de contradições e interpretações errôneas que perduram há séculos.
"O livro que você lê sem entender foi escrito pelo homem ao bel-prazer do Homem. Sendo assim, contém falhas e imprecisões.", eu afirmo, tentando recuperar minha santa paciência.
O enviado não aceita minhas palavras. Ele não está aberto ao diálogo e à chance de um recomeço.
Encosto o sujeito na parede: “Se a porra do teu Deus é AMOR? Se o santo Filhinho afirmou que devemos “amar uns aos outros, como Eu voz amei”, como pode um Deus Perfeito ser tirano, colérico, vingativo? Êta deuzinho burro e neurótico esse não?”
O rapaz começa a chorar. Diz que é um “ex-gay”. Que “gay” é “coisa do diabo” (“O diabo não existe – compreenda isso!”, tento alertá-lo, sem sucesso). Que Deus condena os gays. Que o pastor condena as bibas. Que a sociedade condena os “homocessual”. Que ele era infeliz por não poder viver plenamente aquilo que era “maior do que ele”!
Finalmente, chegamos onde tínhamos que chegar. Litros de lágrimas mexicanas depois, o ex-gay que era gay entrega os pontos. Afirmou que lera meu “Evangelho Segundo Sipriano” e meu “Manual prático para um Suicídio bem-sucedido” na Internet (uia!) e que ficara indignado com meu “atrevimento” e minha ousadia em usar os nomes dos apóstolos na produção de textos do diabo ou em colocar Deus em situação blasfêmica (!!).
Porém ele confessou que foi por causa dos meus textos profanos, foi por causa das minhas histórias pecaminosas que – finalmente – encontrou a resposta para as dúvidas do seu “eu” interior. O rapagote queria viver, queria ser feliz, queria se sentir realizado naquilo que ele era e que não podia ser mudado!
Descobri os motivos de tudo. Foram as pressões absurdas de uma família ignorante. Foram os abusos morais indecentes vindos de um pastor hipócrita (um detalhe para sua informação: o tal “pastor” já trepou com meia Ilha Comprida e é visto sempre na companhia de garotos de aluguel numa cidade vizinha).
Faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço. Piração total.
Mas, Aleluia! Sem querer acabei me tornando o Salvador de uma alma atormentada.
Horas de conversa. Corações abertos. Dúvidas sanadas. O sujeito continuava com Jesus sendo o seu salvador, mas na verdade quem havia libertado sua alma e curado suas chagas emotivas foi o ursão “enviado” aqui.
Na verdade, tudo o que o rapaz precisava era de apoio sincero. Tudo o que ele precisava era ter alguém ao seu lado em que pudesse confiar. Resumindo: ter um amigo esclarecido.
Hoje, esse rapaz está livre para curtir sem peso, sem traumas, sem medos, a sua homossexualidade. Nos tornamos amigos.
Devidamente resolvido, o rapaz, comigo – amigo – ao seu lado, conseguiu “revelar” aos pais que era gay. A mãe se sentiu aliviada, pois não aguentava mais ver o filho sofrer calado. O pai relutou um pouco em aceitar a “condição” do filho, mas acabou se sentindo mais “tranquilo”, quando o filho lhe revelou que era o “homem” na intimidade com outro cara – meigo não?
Diálogo e companheirismo são a base necessária para que tudo na vida possa dar certo.
666 é o número da besta... quadrada e ignorante.
Some os números e o resultado será “9”, numeral que indica, entre outras coisas, a força interior que eu, você e todo mundo carrega escondidinha no lado esquerdo do coração.
Liberte-se!
Nenhum comentário:
Regras:
Todos os comentários serão lidos e moderados previamente;
Serão publicados os que respeitarem as seguintes regras:
- Seu comentário deve ter relação com o assunto do post;
- Não inclua links desnecessários no conteúdo de seu comentário;
- Se quiser deixar sua URL, comente usando a opção OPEN ID;
- Comentários ofensivos a gênero, etnia ou opção sexual serão excluídos automaticamente.
OBS: Os comentários dos leitores não refletem necessariamente as opiniões do blog.